sexta-feira, 23 de julho de 2010

Alvo

projeto palavras mil - 20º edição - foto por: tumblr -Semana especial do escritor
E eu tentava de alguma maneira - de todas talvez - escrever uma carta. E talvez esse fosse exatamente o problema, eu não queria escrever apenas uma carta, ela precisava ser ''A'' carta. Minhas palavras deviam tocar, deviam emocionar, minhas palavras deveriam ser capazes de entrar nas mentes mais fechadas e comover. E isso me consumia, a necessidade de escrever chegava a me machucar.
O pôr-do-sol se aproximava, o maço de cigarro já estava no fim, e restavam apenas dois dedos de café na garrafa. O tempo acabava. O celular tocava insensalvelmente, as folhas estavam acabando e eu não chegava nem um pouco mais perto do objetivo.
Então eu olhei para caneta, aquela que sempre me ajuda. Mas que machuca, meus dedos já doíam, eu a apertava com uma força que se traduzia em desespero. E eu sentia a unha entrando na minha mão, sentindo a caneta tentando, e não podia colocar em um objeto a culpa, a culpa que era inteiramente minha. E senti a pressão e a pior parte de escrever. De ser assim, chamada - escritora - e pela primeira vez tudo que eu amo me machucou com a força de tudo que odeio. As palavras me machucaram. As palavras que faltavam e a ausência, que abriram uma fenda - esconderijo da dor -
E finalmente eu me rendi, atendi ao celular:
-Não, eu não consigo escrever. Eu não posso escrever um epitáfio.
Liguei o computador e vi uma foto, éramos nós duas, éramos melhores amigas, e ela era tanto, era tanto que não podia ser capaz de colocar tudo isso em palavras. Em uma frase. Ela salvou minha vida, e ali estava a foto, estávamos rindo e tão distante de agora. O rosto dela tinha uma alegria tão pura, os olhos uma honestidade, uma diversão, a felicidade em sua forma mais bonita. E foi ai que eu peguei a caneta - agora já não machucava mais - e escrevi enfim: ''Uma heroína''.